Agora, o pensamento único da mídia encontrou uma nova vítima. Entre as muitas que a mídia atacou nestas eleições, talvez seja a menos pensada.
Se multiplicam insinuações na imprensa questionando a candidatura do Tiririca e sua legitimidade, algo nutrido pelo mesmo preconceito que vazou da boca da nossa (psuedo) elite (pseudo) intelectual quando teve que lidar com um metalúrgico chegando ao Planalto.
Senão vejamos: Tiririca é um palhaço. Semianalfabeto, disseram alguns, repetindo a crítica que se faz ao Lula desde sempre. Em resumo, preconceito
Outros dizem: um palhaço, que vai puxar votos prá canalhas como Valdemar Costa Neto e outros corruptos do PR. Novamente, preconceito.
A certeza do fenômeno, que vai ser decisivo no quociente que definirá os deputados federais em São Paulo, não justifica a crítica. Todos os partidos trataram de procurar personagens pitorescos que pudessem atrair votos, uns vão conseguir mais que outros. Por que a crítica só ao Tiririca? Por que os irmãos KLB, que puxam votos pros corruptos do ex-PFL (refugo da ARENA, o partido da ditadura) são inocentados? Questão de berço?
Enfim, todas as críticas ao humorista se resumem no preconceito pelo fato dele ser um palhaço autêntico, como se a democracia consistisse em garantir direitos políticos somente aos que “tem biografia” prá ser político - dentre os quais, muitos palhaços disfarçados de gente séria. Como se o Congresso Nacional não fosse um par de imensos picadeiros.
A desmoralização do Congresso Nacional é uma realidade desde antes do Brasil conhecer o Tiririca. Começou quando os parlementares eram supostamente sérios, e mesmo assim, mantinham a discussão legislativa claramente dissociada dos interesses da população.
Tiririca é um palhaço de circo. Como todo brasileiro, tem direitos políticos reconhecidos, pode ser candidato e merece ser eleito se receber uma votação capaz de legitimá-lo.
A possível presença do pitoresco personagem no (esse sim, infame) Congresso Nacional, classificada por alguns desavisados como escândalo, revela algo mais que a ojeriza de muitos em ver outro mal nascido transitando pelos corredores do poder. Senão, cabe aqui alguns importantes lembretes:
Lembram-se do senador amazonense que disse em plenário que daria uma surra no presidente? E que depois, um deputado baiano, do porte de um ananias, repetiu a mesma ameaça na Câmara? Isso é menos vergonhoso que eleger o Tiririca deputado?
Lembram-se dos deputados comemorando vitórias em votações pulando e gritando “uh dererê” e outros refrões funk em plenário?
Lembram-se de um senador paulista, considerado entre os mais respeitáveis do Brasil, desfilando de calcinha vermelha pelos corredores do edifício?
Isso sem citar as estripulias mais comuns: as abstenções reiteradas, as ausências reiteradas, o abuso de cartões corporativos, o nepotismo, as votações prá duplicar seus próprios salários, a venda de votos prá emenda da reeleição, o show de horrores de cada CPI que se abre prometendo a verdade e se arquiva, meses depois, sem revelar nada nem punir ninguém.
Pior do que está, fica? Ou temos que dar razão ao bordão do Tiririca?
Lembremos também que o palhaço sequer é o primeiro a usar o deboche em benefício eleitoral. Pois em 2002, Enéas conseguiu tantos votos prá deputado federal que levou com ele outros seis companheiros de partido, que juntos não poderiam eleger sequer um vereador em Campinas. Em 2006, Clodovil e Franck Aguiar realizaram façanhas parecidas.
O espetáculo não pode parar, e não vai parar, com ou sem Tiririca. E não adianta reclamar que a piada perdeu a graça com o passar do tempo, que a cada quatro anos aparecem, entre calouros e reeleitos, trezentos tiriricas com anel de doutor em Brasilia, reciclando a anedota e mantendo a lona erguida.
Uma pirueta, duas piruetas, bravo, bravô... Mais um picareta, trezentos picaretas, bravo, bravô...